quarta-feira, 1 de julho de 2009

VIDA DE SOLTEIRO

A história de uma foto



As dificuldades envolvidas na revelação
da verdadeira sexualidade, contadas
por quem sabe do que fala

O empresário paulista Mauro Ferraz, 43 anos, nunca escondeu sua homossexualidade, mas não costuma alardear sua preferência sexual. Em função de seu estilo reservado, muitas vezes surpreendeu amigos para quem, depois de algum tempo de convivência, revelou ser gay. Alguns deles, após saber da notícia, se afastaram e o contato com outros ficou restrito a telefonemas esporádicos. De um terceiro grupo, no entanto, recebeu o tratamento que esperava: a amizade se manteve inabalada. Quatro de seus amigos verdadeiros concordaram em se deixar fotografar ao lado de Ferraz para esta reportagem. A seguir, eles relatam o que sentiram ao saber da homossexualidade do amigo, no momento em que Mauro Ferraz abriu o jogo, e analisam como a revelação afetou o relacionamento. Ferraz também foi entrevistado.

Claudio Rossi
Da esq. para a dir., Tânia, Pedro, Regina, Mauro e Walter: amizade inabalada depois da revelação

1. A ex-namorada
Tânia Canadá, 39 anos, sommelière
"Conheci o Mauro por telefone. Quando o vi pessoalmente, pensei comigo: 'É ele!'. Foi paixão à primeira vista. Mauro é alto, lindo, doce, culto, carinhoso... Começamos a sair e, depois de três meses, armei uma festa-surpresa no dia do seu aniversário. Peguei escondido a lista dos melhores amigos e a maioria deles era homem. Não suspeitei de nada. Pelo contrário, achei ótimo não ter outras possíveis concorrentes no pedaço. No meio da festa, o Mauro me chamou para o quarto e disse que o amigo que havia me ajudado a armar a surpresa tinha sido seu namorado por onze anos. Não consegui ouvir mais nada. Fui embora chorando. Fiquei apavorada e tive pensamentos contraditórios. Ao mesmo tempo em que senti ódio, pensei também em reconquistá-lo, pode? Passou-se um ano sem que nos falássemos. Um dia, resolvi ligar para ele, marcamos um cinema e saímos de lá amigos."

2. O melhor amigo
Pedro Mello, 34 anos, empresário
"Conviver com um gay tem inúmeras vantagens. Os homossexuais são divertidos, alegres e, principalmente, não falam sempre sobre as mesmas coisas. Quando homens heterossexuais se juntam, é para conversar sobre mulher, trabalho e futebol. Descobri que o Mauro era gay por acaso. Tínhamos amigos em comum e estava numa roda com eles quando um dos rapazes contou que tinha namorado o Mauro. Fiquei um pouco surpreso, mas qualquer pensamento sobre a sexualidade dele parou ali. Continuamos grandes amigos. O Mauro tem um companheiro muito bacana. Em diversas ocasiões eu e minha mulher os convidamos para participar de programas típicos de dois casais que se dão bem: cinema, teatro, restaurante. Sei que isso não é tão comum e entendo as razões do preconceito. A amizade entre o homossexual e o hétero é delicada. Muitos gays ultrapassam o limite e assediam, mesmo sabendo que você não é do ramo."

3. A melhor amiga
Regina Telechun, 46 anos, publicitária
"Certa vez, durante um passeio com nossos cachorros, o Mauro fez um comentário sobre um ex-namorado dele. Eu já sabia que ele era gay, através de um amigo comum. Achei legal o Mauro ter se aberto comigo. Tomei aquilo como uma prova de que confiava em mim. Ele continua sendo um dos meus melhores amigos, o único gay. É uma relação diferente. Certa vez, por exemplo, o pneu do meu carro furou em uma rua escura perto de casa. Chamei um funcionário do condomínio para me ajudar. No dia seguinte, comentei o episódio com o Mauro, que me deu uma bronca por não tê-lo avisado. Na próxima, vou recorrer a ele. Não chamaria uma mulher para me socorrer, entende? Como sou separada, recorro muito a ele quando tenho problema com meu filho de 10 anos. Tenho amigas que acham isso um absurdo. Falam que ele pode ser influenciado negativamente pelo Mauro. Puro preconceito. Ninguém vira gay para copiar alguém!"

4. O personagem
Mauro Ferraz, 43 anos, empresário
"Sou um gay bem resolvido. Já tive casos com mulheres, mesmo convencido de que meu interesse real é por homens. Aos 19 anos, resolvi abrir o jogo para o Walter, que é heterossexual e me contou que já desconfiava de tudo. O bacana é que nossa relação nunca mudou. Imaginando que a reação das pessoas fosse ser amena como nesse caso, procurei outro grande amigo. Na hora de contar, eu gesticulava muito durante a conversa e, sem querer, minha mão esbarrou na perna dele. O olhar de censura que ele lançou dispensava palavras. Ele não queria saber de nada. Felizmente, a reação negativa representou uma exceção. Sempre fui aceito. As amizades que ficam depois de um certo tempo na vida são aquelas com as quais você tem afinidades de fato, independentemente de sua preferência sexual."

5. O amigo de infância
Walter Ponge, 41 anos, professor universitário
"Eramos adolescentes e estávamos fazendo um curso de pára-quedismo no interior de São Paulo quando o Mauro chegou para mim e disse: 'Sou gay'. Eu já desconfiava. Apesar de ser um sujeito discreto e sem nenhum tipo de afetação, o Mauro começou a mudar por volta dos 18 anos. Tocava em assuntos relacionados à homossexualidade e, ao mesmo tempo, a quantidade de gays presentes a suas festas era cada vez maior. É claro que ter um amigo assim muda um pouco as coisas. É como se a amizade fosse colocada à prova algumas vezes. Preocupo-me com isso até hoje. Não por temer uma cena de assédio por parte do Mauro, mas por medo de ser confundido com um gay. Certa vez fui com ele a um parque de diversões em São Paulo. Na mesma turma havia outros amigos de Mauro, muito mais bandeirosos. Vi de longe que um grupo de meninas nos olhou e desconfiou. Tive um impulso de ir até lá para esclarecer a situação, mas acabei me controlando. É preciso ter sangue-frio nessas horas e lembrar que uma amizade verdadeira é mais valiosa do que qualquer tipo de insinuação."




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